Alerta!
Creio que foi Richard Rorty que escreveu, no início dos anos oitenta, que "há pessoas que escrevem como se só existissem textos". Alerto para o facto de haver, hoje em dia, muita gente que bloga como se só existissem blogues na vida. Às vezes, passo por vários blogues e reconheço a tendência, o germenzinho, a picardia involuntária, a moenga imaculada, a nódoa embevecida, a lamúria ressentida, o escárnio deliberado, o ardor incontinente, a resposta desnudada, a guerrinha vitoriosa, a verve viscosa e a remissão pouco alterada. Fico pasmado, sorrio, relembro cenas exultantes e aceno por fim com ambas as mãos a bater palmas a tanta ventania, embora saiba de cor (i.e., pelo coração) que a vida continua. Mesmo aqui, na íntima e prolixa rede dos blogues.
Tal como
ele, tambem eu poderia fazer a minha lista musical. Poderia, mas não a faço; é tudo ainda muito doloroso.
Tu tens um medo:
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo o dia.
No amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
Cecília Meireles